04 Apr
A Cultura Digital na Educação de Jovens e Adultos: Reflexões a Partir de uma Escola Pública em Altamira-PA

A chegada da chamada "quarta revolução industrial", marcada pela ubiquidade das tecnologias digitais, trouxe impactos profundos para todos os setores da sociedade — e a educação, sem dúvida, é um dos mais afetados. No entanto, os benefícios da digitalização ainda não alcançam a todos de maneira equitativa, sobretudo quando falamos da Educação de Jovens e Adultos (EJA), especialmente em regiões periféricas como Altamira, no Pará.

Um estudo publicado na Revista Docência e Cibercultura (2023) por Judith Anteles Moreira, da Universidade Federal do Pará, relata uma experiência de estágio supervisionado na EJA de uma escola pública do município e revela os desafios enfrentados pelos professores e alunos no processo de ensino-aprendizagem digital. O artigo oferece uma análise crítica que merece destaque nas discussões educacionais atuais.

O Estágio Supervisionado como Espaço de Aprendizagem Real

O estágio supervisionado na EJA emerge como uma oportunidade vital para os futuros professores desenvolverem competências que ultrapassam a teoria acadêmica. A prática pedagógica nesse contexto exige sensibilidade, adaptação e inovação, especialmente quando o público-alvo carrega consigo uma bagagem de exclusão escolar e digital acumulada ao longo da vida.

No cenário estudado, havia 11 alunos matriculados na 2ª etapa da EJA, mas apenas um frequentava as aulas presenciais. Este dado já denuncia o efeito devastador da pandemia de Covid-19 na continuidade dos estudos dessa população, marcada por dificuldades de acesso à internet, falta de equipamentos digitais e uma rotina de trabalho exaustiva.

Desigualdade Digital: Um Desafio Estrutural

A exclusão digital foi uma das principais barreiras observadas. A ausência de letramento digital por parte de professores e alunos comprometeu a efetividade do ensino remoto, evidenciando a carência de políticas públicas voltadas para formação continuada de docentes no uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs).

A estrutura escolar, por sua vez, é precária: segundo dados do QEdu, apenas 6% das escolas municipais de Altamira possuem biblioteca, 30% têm laboratório de informática, e 32% possuem internet banda larga. Tais índices revelam que não basta exigir inovação pedagógica se as condições materiais mínimas não forem garantidas.

Cultura Digital: Uma Urgência na Formação Docente

O artigo enfatiza que o letramento digital deve ir além do uso instrumental da tecnologia. Professores precisam estar aptos a utilizar as ferramentas digitais de forma crítica, criativa e pedagógica. Isso demanda uma formação docente mais robusta, que inclua o domínio das tecnologias e a compreensão do seu papel como mediadoras de conhecimento, e não meras substitutas do ensino tradicional.

Como nos lembra Freitas (2010), é fundamental que professores e alunos sejam “letrados digitais”, ou seja, que saibam apropriar-se da tecnologia, dando-lhe sentido e aplicabilidade crítica em suas práticas.

Caminhos para a Superação

A experiência relatada por Judith Anteles reforça a importância do estágio supervisionado como espaço de pesquisa e intervenção. Estar no campo permite aos futuros educadores desenvolverem práticas baseadas na realidade social dos alunos, ressignificando o papel do professor na contemporaneidade.

É preciso investir na formação docente contínua, na infraestrutura das escolas e na formulação de um currículo específico para a EJA, que respeite as particularidades dessa população. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), por exemplo, ainda falha ao não oferecer diretrizes claras e contextualizadas para esse segmento educacional.

Conclusão

Promover a inclusão digital na Educação de Jovens e Adultos não é apenas uma questão tecnológica, mas um imperativo social. As práticas pedagógicas precisam ser repensadas à luz das novas dinâmicas de produção e compartilhamento de saberes, onde o digital não é apenas ferramenta, mas linguagem, cultura e identidade.

Altamira é um retrato ampliado de tantos outros municípios brasileiros que enfrentam os mesmos dilemas. Que o relato dessa experiência sirva de inspiração e alerta para gestores públicos, formadores de professores e todos aqueles comprometidos com a democratização da educação.

📚 Fonte: MOREIRA, Judith Anteles. A Cultura Digital na Educação de Jovens e Adultos em Escola Pública Municipal de Altamira – Pará. Revista Docência e Cibercultura, v. 7, n. 3, p. 39-54, 2023. DOI: 10.12957/redoc.2023.73422

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